4ª Carta
Atencioso irmão,
Recordo-me de quando as palavras não possuíam significado algum. Quando os sentidos eram tão vagos quanto o escuro de minha existência. Hoje pulsa tão forte meu coração diante aos significados que lamento ver o mundo perder. Angústia que um dia me fez ver a necessidade de descobrir quem sou.
Talvez seja realmente o que sempre nos moveu. A busca pelas respostas que nunca farão parte de nossas vidas. Respostas que por si só não revelam o que buscamos. São tão desnecessárias quanto o medo que carregamos junto da incerteza de quem somos.
Muito me traz incômodo saber que o motivo de nossas angústias gira em torno do mundo superficial em que vivemos. Os laços afetivos de total liquidez nos fazem perder a essência de quem somos. Fazem-nos esquecer de quem fomos. Superficialidade de uma angústia que nos sufoca, não por si só, mas pela ausência da necessidade de nos descobrir.
Angústias nos remetem a escolhas. Os afetos superficiais, por mais angustiosos que sejam nos privam de escolher, pois nos ausentam de nosso verdadeiro valor. Presumo que seja o que acontece hoje. O que suas palavras tentam me dizer. Apesar dos próprios atos de dissimular e mentir implicarem em uma escolha, aqueles que não têm consigo a importância que lhes cabe, são incapacitados de viver por conta própria. Vivem a deriva de uma angustia a qual não lhes pertence. Angustia que os sufocam. Incertezas que os privam de viver.
Da forma mais singela descubro o que tanto lhe fascina em Sartre. “A angústia nasce das possibilidades...” Ter mais de uma opção faz que o coração se divida para exercer a escolha. Dinâmica que faz redescobrir os caminhos que de minha vida fazem parte. Movimento que faz girar a lógica inexistente dos sentimentos que, aos poucos, se perdem no superficial de cada dia.
Particularmente demorei a compreender o que as palavras tentavam me dizer, e quando pensei realmente entender, descobri que de muito não precisava. O silêncio por si mesmo já nos diz muito. Não sobrevivemos à superfície. Não sobrevivo à superfície.
Há palavras que possam alcançar as raízes de nossas angústias? Não sei. Prefiro permanecer no silêncio da contemplação. O que hoje sentimos é fruto de nossas angústias, mas são sentimentos que, assim como nós, não sobrevivem à superfície. Amor nunca foi um sentimento superficial. Sei que concorda comigo. Onde acha que está o “amor” hoje? Será que conseguiremos conviver sem as dúvidas que tanto nos sufocam?
Eu espero ansioso por este dia. Quero descobrir a graça de sorrir diante de tudo o que ainda não sei. Quero que a matriz de minhas alegrias seja o que da vida não se descreve... Amor que ainda o mundo não foi capaz de sentir. Despeço-me com a angústia de quem muito se sente grato por suas palavras, na espera de seus próximos versos
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